quarta-feira, fevereiro 27, 2008

Castor

E deste modo, o pequeno castor, perdeu o seu nariz…

quarta-feira, fevereiro 20, 2008

Miúdo Vs God

Um pé atrás do outro. Vejo o chão a passar. Ouço gentes, mas mantenho os olhos colados ao solo. Uma barata foge à minha frente, para se enfiar num buraco. Uma pedra de calçada está fora do sítio. O lancil põe termo ao passeio. Segue-se alcatrão. Um pouco de areia e algumas manchas de óleo, já há muito entranhado no piso. Folhas secas, junto ao lancil do outro lado da estrada; piso-as. O som é delicioso. Os estalidos, que se assemelham ao crepitar de batatas a fritar, transmitem-se pelos meus pés. Subo para o novo passeio. Os carros passam ao meu lado. Sapatos em movimento aproximam-se e logo se afastam. Não existo. Nem Deus se lembra de mim. Só agora posso perscrutar o segredo da existência. Estou livre do mundo, para poder debruçar-me sobre o sentido da vida, sem que seja fulminado pelo pecado supremo do entendimento da sua essência.

quarta-feira, fevereiro 13, 2008

Poeta masturbador

Tropeço em palavras banais

Pinto-as com cores estonteantes

Nada querem dizer

Quem se importa?

Quem quer saber?

Hipnotizo-os com a minha eloquência

Demonstrando nada mais que sapiência

E quando estou só, só em mim penso,

Só em mim procuro a fuga para esta dor

De ser maior, de ser o melhor

Preconizo a masturbação contida no próprio

Encontrando assim o êxtase no meu ser

sábado, fevereiro 09, 2008

Negócios alternativos


DESENHO: Mike

quarta-feira, fevereiro 06, 2008

O Pequeno Wells

Ouço um zumbido. Concentro-me nele: não é linear. É o trautear de uma melodia simples. Repete-se incessantemente. Reconheço-a; traz-me memórias. Miúdos saltavam, ao mesmo tempo que dançavam, em círculos à minha volta. Sempre a cantarolar as mesmas palavras. Fechava os olhos e pensava que estava na segurança da minha casa, do meu quarto. Julguei que assim suportaria melhor a situação, mas creio que cometi um erro. Eles já não existem, mas o inferno, esse prolonga-se até hoje. Procuro debaixo da cama e encontro-o aí, como habitual. O meu pequeno Wells... Dizem-me que não existe. No entanto, se tal fosse verdade, ele não gozava comigo todas as noites e eu não o esventrava todos os dias.

sábado, fevereiro 02, 2008

Quem és tu?

Parei à sua frente. Madeira pintada, já desgastada pela idade. Fiquei absorvido pela imagem. Estava crucificado, com a cabeça baixa, mas os seus olhos erguidos na direcção dos meus. Senti pavor. Medo de que ele se mexesse a qualquer momento. Tentei afastar-me. A cada passo que dava, caminhava para ele, como se estivesse a guiar-me. Não queria aproximar-me. O suor na minha testa adensou-se, neste esforço para contrariar a hipnose. Formaram-se pequenas gotas que me escorriam pela face. Percebi que não fazia sentido resistir-lhe, e deixei-me ir. Vi a minha mão subir até ao seu peito e entrar no seu corpo. Consegui sentir todas as suas camadas, à medida que o ia atravessando. E no seu interior, vazio. Era este que me chamava, que me queria devorar. Repentinamente, readquiri o controlo: retirei a minha mão do seu interior e dei alguns passos atrás. O meu ódio ateou-lhe fogo. As chamas levantaram-se, mas ao invés de ser destruído, apenas a pintura exterior foi desaparecendo. Primeiro, enegrecendo e, finalmente, fazendo sobressair um estranho brilho. Para meu pesar, a tentativa de aniquilação limitou-se a dar-lhe vida.