A Morte caminha em mim. Cheiro-a com os poros abertos da minha pele. Detesto-a, mas não se afasta. Falo com ela, umas vezes a bem, outras com sangue na guelra. Nada resulta. Segue-me, persegue-me, atormenta-me os dias em que a tento ignorar. Dirigi-me a médico espiritual que me receitou incensos e rezas. Cumpri tudo à risca. Ela relaxou e assentou. Agora parecia mais um tijolo de uma sólida construção. Chamei até uma parteira, que se disponibilizou a passar várias noites ao meu lado. Não fossem todas as pequenas mortes criadas por nós e talvez tivesse tido algum efeito. Fiz um piquenique num cemitério, esperando que ela se sentisse em casa e por ali ficasse, mas não se deu com os cheiros do sítio. É peculiar, a rapariga. Há quem diga que é estranha (ou terá sido a mim que chamaram tal?). Arranjei um emprego num hospital como auxiliar de limpeza – tratava do lixo – carreguei baldes sem conta. Ela odiou aquela gente que morria, aquela gente que se curava, e entranhava-se cada vez mais. Fomos para prados sem fim, desertos imensos, superfícies geladas sem qualquer réstia de vida, e ela refugiou-se no meu coração. Morre, Morte! Morre e deixa-me entrar na casa da solidão.