sexta-feira, maio 04, 2007

Memórias do Nunca - Parte 11

Não termina

Outra vez aqui a olhar para as minhas mãos desejando que o choro me corra pela face. Mas apenas o desejo se mantém... Nada mais que isso. Numa tensão crescente de quem não encontra paz nem vê a sua solução. O final premeditado já há muito que deixou de ser opção, por isso apenas a continuação do que está para ser pode existir. Não queria um novo amor, nunca o desejei, mas o meu corpo continua a comandar e a entrega da minha alma acabou por trazer-me novamente a este ponto. Não queria mas estou novamente aqui. Quero a minha visão turva pelo choro, o corpo com espasmos de tristeza de quem não existe, os músculos com dores de consecutivas contracções, a mente caída num vazio trazido por um acto de libertação. Quero deixar de escrever por necessidade... isto não passa de terapia para a doença da solidão. Outra vida que passa por mim, num acumular de gente que viverá para sempre comigo. Infelizmente continua tudo sem sentido... já percebi... desculpa incomodar-te. Não quero outro dia assim. Não vale a pena sentir novamente. Está a tornar-se numa rotina que não sei até quando vou suportar. Choro, é tudo o que desejo agora. Nem sei o que sinto. Apenas tenho esse desejo... água salgada sem fim a sair de mim, convulsões e esquecimento. Como odeio tudo isto! Como me sinto estranho numa terra de gente normal. Só mais uma vez... acho que aguento... porque não, é apenas mais uma. A rotina traz o hábito de deixarmos de ser nós para nos tornarmos no que temos de ser. Uma droga de alienação do que é realmente a vida. A vida que odeio... a rotina que não suporto... o encontro com as pessoas que, por mais que queira, não consigo perceber. Por isso, tanto as detestei... agora acho que simplesmente me conformei em não esperar nada de mais delas. Mas a mudança traz-me de volta a mim, ao mundo que tenho dentro de mim. Quero chorar... só quero chorar... nada mais que isso... só mais uma vez, quero chorar porque me apetece chorar...

1 Comments:

Blogger Elsa Menoita said...

A compreensão é nos trazida pela identificação, muitas vezes. Quase todas as vezes - acreditem, se virem mais além! poucos são nutridos de empatia. compreendemos quando olhamos para nós.
Tal aconteceu-me ao ler mais um rasgo dos teus desabafos.
A rotina - significação de demandas sempre reiteradas que nos impõem e que permitimos que o façam, retira a nossa identificação. deixamos de perceber quem somos num mundo que dita quem deveremos ser. seres traduzidos em acções e bens expostos aos olhares. acabamos por ser quase só o que fazemos e o que temos; e pouco mais sobra de nós. e nós assistimos sem ver, de olhos bem vendados e cerrados para a nossa triste atomização.
Estes teus desabafos, imprimidos em letras, palavras, são não mais do que sopros do ser que fazes por sobrar de ti!, nem que seja o sonho dos teus seres que permites que coexistam em ti. Estes não são uma terapia de solidão; poderão ser de isolamento. podes estar longe de todos. mas nunca estarás só. o mundo está repleto de seres sós - todos aqueles que não se ouvem e não se vêem. Tu ainda existes!, porque parafraseando-te "tens um mundo dentro de ti".
As gentes regidas por uma normalidade castradora, escolhida por uma maioria, saca da liberdade e da diferença que nos distingue de seres domesticados. Urra!, à diferença!! Mas os diferentes indubitavelmente sentir-se-ão despejados num claustro sem janelas. mas amigo!, leva uma vela contigo, um papel e uma caneta!

5/5/07 23:43  

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