Meti-me numa jangada. Remei durante um tempo interminável até ter como visão única a água. Porque não quero ver ninguém? Porque não posso ouvir ninguém? Porque me sinto incapaz de tocar alguém? Anda para trás. O mar levanta-se. A jangada balouça. Seguro o pequeno cofre junto a mim. Estou novamente nos teus braços. Apaga. Segue mais um pouco. As tuas palavras deambulam por mim. Apaga. Que está a acontecer? O sal dissolvido cai-me na boca. Desliga. Onde estás? As estrelas não param. Sinto-me enjoado. Aperto o cofre com mais força. Sinto-o rasgar-me a pele. O calor do teu ventre liberta-se em mim. Apaga. Outra vez. Quase lá. Vem comigo. Não te quero deixar. O cheiro do teu corpo enche-me a alma. Apaga. Ainda por aqui? Recusa-te, por favor. Sorris para mim fazendo-me esquecer a minha mortalidade. Apaga. Quem és tu que ficaste? Pouso o cofre na jangada. Abro-o. As cinzas de quem não me recordo espalham-se com o vento. Levanto-me e olho-as uma última vez. Saboreio a tua língua, os teus lábios, os teus fluidos. Apaga. Não resta nada. Deixo-me cair na água, com cinzas em meu redor, e sou absorvido pela paz dos sons distantes e calmos deste submundo aquático.
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